Viagens no scriptorium, Paul Auster


Viagens no scriptorium (Companhia das Letras, 2007, 128 p., tradução de Beth Vieira), de Paul Auster (1947 - ) é um livro cujo enredo trata da memória e da escrita literária. De modo tenso e cheio de suspense, deixando o leitor angustiado em alguns momentos (como nas reiteradas passagens que apontam para a dúvida do protagonista sobre o quarto estar ou não trancado), me fez pensar tanto nos impactos do Alzheimer, quanto na capacidade humana de criar/imaginar/inventar.
O protagonista é Blank, um homem velho que se encontra num quarto, vigiado por câmeras e microfones, e desconhece (porque esqueceu) totalmente o seu passado e o motivo pelo qual ali está, sabendo, ou melhor, sentindo que carrega uma grande culpa por algo que fez. Esse tempo pretérito passa a ser reconstituído aos poucos, por visitas que recebe, nomes de pessoas que anota, situações que vivencia e imagina no quarto fechado e solitário. O leitor, assim como Blank, não consegue construir uma explicação linear sobre sua vida apenas com as informações disponibilizadas pelo narrador, mas descobre que ele causou sofrimento e dor a muitas pessoas. As possibilidades – variáveis – são muitas e cabe ao leitor imaginá-las, supô-las.
Um manuscrito com uma estória inacabada na escrivaninha do quarto e algumas fotografias passam a ser a tônica da criação, imaginação e memória de Blank. Seria aqui o caso da ficção dentro da ficção. Seria este um recurso de Paul Auster: disparar uma construção ficcional a partir de um fragmento de ficção que, por si só, poderia render uma obra. Mas o interesse do autor é outro, é justamente olhar a escrita literária “de fora”, de um suposto “real” que precisa construir um “ficcional”.



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